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Review | Neva é uma deslumbrante jornada sobre amadurecimento

Desde que conheci o trabalho do estúdio Nomada com GRIS, ficou difícil não ansiar sua próxima produção. Considerado um dos melhores jogos de 2019 e reconhecido com muitas premiações em eventos como GDC e The Game Awards, o colorido e abstrato indie rapidamente conquistou o público, alcançando a incrível marca de 3 milhões de cópias vendidas.

Com o selo de publicação da Devolver Digital, Neva chega com altas expectativas, principalmente no que diz respeito ao método que tanto popularizou o primeiro projeto da equipe, transformando magistralmente o que parecia ser apenas um bonito jogo de plataforma em uma profunda experiência sobre autodescobrimento e perda.

Crescer e amadurecer

Enquanto GRIS aborda uma jornada solitária sobre uma jovem esperançosa perdida em seu próprio mundo, Neva introduz duas protagonistas distintas e muito mais ávidas. Alba é uma guerreira impiedosa e protetora, e tem como objetivo purificar o ambiente ao seu redor ao lado de Neva, uma insólita loba com chifres que ficou órfã.

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Inseparáveis, Alba e Neva vão crescendo conforme a narrativa progride, o que é perceptível principalmente na pequena fera. No primeiro capítulo, ela é apenas uma filhote curiosa que mal consegue saltar longas distâncias – você precisa instruí-la e acolhê-la emocionalmente, para que siga enfrentando os perigos ao longo do caminho. Conforme Neva amadurece e aprende novas habilidades, finalmente a vemos explorar o cenário com seu próprio instinto. Por outro lado, este ímpeto de descoberta dá espaço para que floresçam preocupações em Alba, segmentando desafios para a relação e adicionando camadas ao vínculo emocional que as une.

A forma como a jornada explora o conceito de crescimento e relação entre pais e filhos é afável e sagaz. Crianças são curiosas e dependentes, e o espírito de rebeldia cresce junto com elas. Os desafios para lidar com novas experiências em diferentes situações é o que torna tão desafiador educá-las. E quando estas crescem e se tornam adultos com seus próprios sonhos e desejos, cabe aos pais ou mentores, respeitá-las. E é sobre isso que Neva se trata, afinal: amadurecer é natural e ciclos são inevitáveis.

O esplendor da simplicidade

Se GRIS era belo e absorto, Neva é deslumbrante e insurgente. Com inspirações declaradas em Shadow of the Colossus e The Last Guardian e uma das direções de arte mais lindas que já vi em uma peça de mídia, o jogo é estonteante a cada passo. O trabalho primoroso de Conrad Roset, principal artista do projeto, evoca cenários absurdamente bem desenhados e uma composição de cena que emociona com a riqueza de detalhes. Foi impossível para mim não me impressionar com o nível que o Nomada Studio alcançou artisticamente.

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Este é um daqueles trabalhos que demonstram na prática como a criatividade para construir visualmente é mais importante para a beleza de um jogo do que sua complexidade gráfica ou tecnológica. Além de bonito, é um deleite sensorial, com capítulos que avançam acompanhando as estações do ano. Em uma apresentação donairosa sobre a vida, Neva é definitivamente uma das mais lindas experiências que já pude ter.

As animações dos personagens, inimigos e cenários são igualmente impressionantes. Todas feitas à mão, remetem até mesmo as criações do lendário Hayao Miyazaki (Studio Ghibli) em alguns momentos. Acompanhei em 2019 GRIS vencer como “Melhor Animação de Personagens em um Jogo” no Annie Awards 2019, e não vejo uma realidade em que Neva não dispute na mesma categoria.

Sua tocante trilha-sonora original, composta no piano, torna a experiência ainda mais envolvente e atordoante. Toda a parte artística é de um capricho invejável, reforçando como o pequeno estúdio de Barcelona valoriza esse aspecto em suas produções.

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Silêncio & Sangue

Um dos artifícios que mais valorizei quando joguei GRIS foi a capacidade do jogo em contar uma história e transpassar emoções sem utilizar diálogos, o que está de volta em Neva. Claro, isso também é condicionado por um fator de orçamento, afinal, são projetos menores. Mas é de se admirar como conseguem conduzir com tanta maestria uma narrativa de forma tão simples e ainda assim, emocionar.

O silêncio também é um elemento fundamental em Neva. A música do jogo é interrompida em determinadas seções, o que aumenta a tensão no ar e o prepara para o clímax. Tudo isso em contraste com a ambientação dos cenários, que entregam pistas sorrateiras sobre o que está acontecendo – ou o que pode acontecer.

Uma das diferenças em relação ao primeiro projeto do Nomada é a introdução ao elemento de combate. Alba empunha uma longa espada, desferindo golpes diretos nos inimigos e impulsos em direção ao solo. Ela também tem acesso desde o início a pulos duplos e um dash, o que deixa sua movimentação bem fluída. Neva não fica de fora, e ataca os inimigos que estão por perto ou sob o comando de sua companheira, quando possível.

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Nossa protagonista tem três pontos de vida, que regeneram-se ao desferirmos golpes consecutivos sem interrupção ou ao alcançar os Santuários de Cura. Há lutas de chefe engajantes e momentos épicos, em um nível de dificuldade até interessante para o estilo (no Modo Aventura). Nada é muito complexo, mas certamente adiciona uma camada estimulante de progressão na curta campanha. A mudança também deixa o jogo menos monótono, já que muitas sequências de combate divertidas substituem os longos trechos de “walking simulator” de GRIS.

Arte em meio ao ópio

Ainda que com novidades em relação ao primeiro projeto, aqui se desenha uma fórmula cristalina para os jogos do estúdio. Acrescentar camadas de profundidade de maneira sutil a títulos de plataforma que num primeiro momento parecem básicos é sem dúvidas, a especialidade da equipe.

Dar atenção quase total aos elementos artísticos para destacar os seus projetos, também não é exatamente uma solução simples para lidar com a complexidade dos trabalhos, como muitos podem imaginar. Jogos como Limbo ou Planet of Lana fazem algo semelhante, utilizando a parte visual e sonora de maneira inteligente em determinados aspectos da produção para compensar a falta de variação na jogabilidade como recurso.

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Utilizando a corrupção dos meios e a destruição do planeta como bases fundamentais para o desenrolar de suas problematizações, o jogo mistura assuntos complexos com muita delicadeza, mesmo que de maneira abstrata. A sensação de estar jogando em uma pintura é constante, tanto pelo visual quanto pela maneira que se ilustram as adversidades.

Mesmo dentro de suas limitações, é inspirador ver seu brio artístico florescer na tela. GRIS veio para mostrar ao mundo a beleza de uma ópera sobre luto. Neva chega para sacramentar o talento do pequeno estúdio catalão, apresentando uma verdadeira odisseia minimalista sobre relações parentais. É um jogo apaixonante, que acima de tudo, merece os louros por conseguir captar com tamanha sensibilidade os sentimentos e dores causados por ciclos que todos nós sabemos que vamos enfrentar ao longo de nossas vidas.

Tudo quanto vive, vive porque muda; muda porque passa; e, porque passa, morre. Tudo quanto vive perpetuamente se torna outra coisa, constantemente se nega, se furta à vida. – Fernando Pessoa

Este jogo foi cedido gentilmente pela Devolver Digital. A análise foi realizada com base na versão de Xbox Series S, assim como todas as capturas de tela vinculadas.

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Neva
9.0Excelente
Descrição
Deslumbrante e encantador, Neva é uma verdadeira odisseia minimalista sobre relações parentais, e chega para consolidar o estúdio Nomada como um dos mais talentosos no cenário independente da atualidade.

Positivo

  • Direção de arte fantástica
  • Animações de qualidade
  • Combate simples e divertido
  • Profundidade abstrata
  • Bela trilha-sonora

Negativo

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  • Pouca variação de jogabilidade

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